quarta-feira, 10 de junho de 2020

Artigo Sílvio dos Santos - Navegação na Hidrovia do São Francisco

O Rio São Francisco foi descoberto por Américo Vespúcio em 4 de outubro de 1501, durante a expedição de Gonçalo Coelho e possivelmente André Gonçalves. A grandeza do Rio já era conhecida dos índios tupi, que o chamavam de Opará, em português: Rio Mar.

Vapor São Salvador no Baixo São Francisco, Augusto Riedel, 1868 - Acervo: Thereza Christina Maria, Biblioteca Nacional

Imagem: Hidrovia do Rio São Francisco - Elaboração: Sílvio dos Santos, 2013

Mapa Estrada de Ferro Paulo Afonso (século XX) - Acervo da coleção Thereza Christina Maria, Biblioteca Nacional


O baixo São Francisco era navegável até Piranhas, a aproximadamente 205 km da foz oceânica, a jusante da Cachoeira de Paulo Afonso. Em 23/10/1878 foi iniciada a construção da Estrada de Ferro Paulo Afonso, que partia do Porto de Piranhas, à margem do rio São Francisco, até Jatobá. Essa estrada, denominada de Paulo Afonso, foi construída pelo Governo Imperial.
Em 25/02/1881 foi entregue ao tráfego o trecho de Piranhas a Olhos d’Água, com 27,8 km e, em 02/08/1883, o último trecho até Jatobá, ficando a linha ferroviária com a extensão total de 115,8 km.
A política de interligar por ferrovia os estirões navegáveis dos rios foi feita não apenas no Rio São Francisco, mas também no Rio Paraná, com a Estrada de Ferro Mate-Laranjeira, e no Rio Madeira, com a Estrada de Ferro Madeira Mamoré.
A ideia surgiu com a visita, em 1868, de Dom Pedro II, do fotógrafo Augusto Riedel e de Luís Augusto, Duque de Saxe, genro do Imperador Pedro II, em uma expedição de navio a vapor ao longo do Baixo Rio São Francisco.

Baixo São Francisco em Penedo/AL – J. Paul Getty Museum/Marc Ferrez (1875)



Até a década de 1960, a navegação no Baixo São Francisco era feita pela Companhia de Navegação Peixoto, utilizando diversas embarcações como lanchas, chatas e canoa de tolda e mesmo navios gaiolas, embarcação a vapor movida por rodas, como o Comendador Peixoto II, em uma expedição de navio a vapor ao longo do Baixo Rio São Francisco.
Nos 205 km do baixo São Francisco, além de Piranhas e de outras pequenas vilas, quatro cidades tinham portos: Penedo, a 42 km da foz; Propriá e Porto Real do Colégio, a 73 km da foz; e Pão de Açúcar, a 165 km da foz.

Navio Comendador Peixoto em Penedo/AL, Comissão do Vale do São Francisco (1960) - Correio do Povo © 2012



O médio São Francisco tem início na montante dos obstáculos de Paulo Afonso e Xingó, incluindo o Lago de Sobradinho. O Rio São Francisco foi represado com a usina hidrelétrica de Sobradinho, na década de 1960, e a construção de eclusa permitiu a continuidade da navegação fluvial no médio e no alto São Francisco. As barragens em Paulo Afonso e Xingó não dispõem de eclusa, condição que não permite a navegação entre o médio e baixo São Francisco. O transporte de passageiros, em navios gaiola, permaneceu até meados dos anos 1970, e atualmente há somente a navegação de embarcações de recreio e de turismo ao longo do belo ”canion” que margeia o Rio São Francisco.

As obras de Transposição das Águas do Rio São Francisco têm duas tomadas na margem esquerda:
  • Eixo Norte: constitui-se em um percurso de aproximadamente 400 km, com ponto de captação de águas próximo à cidade de Cabrobó/PE;
  • Eixo Leste: as águas deste eixo percorrem distância de 220 km a partir da barragem de Itaparica, no município de Floresta/PE.

Bom Jesus da Lapa/BA no médio São Francisco, Augusto Riedel (1868) - Acervo:Thereza Christina Maria, Biblioteca Nacional

Eclusa de Sobradinho/BA, Brasil - Foto de Carlos Eduardo D’Almeida, 1978


Dados gerais da eclusa:
- Desnível máximo: 32,5 m;
- Comprimento: 120,0 m;
- Largura: 17,0 m;
- Calado máximo: 2,50 m

Canal de acesso à eclusa de Sobradinho/BA, Brasil - Foto de Carlos Eduardo D’Almeida, 1978


O limite da navegação do alto São Francisco era constituído pelas corredeiras de Pirapora, já em Minas Gerais, onde a navegação era integrada à Estrada de Ferro Central do Brasil, cuja inauguração ocorreu em 1910. Em 1922, foi construída a ponte ferroviária sobre o Rio São Francisco com o objetivo de se seguir até Goiás. Esse prolongamento, entretanto, nunca foi concretizado.

Ponte ferroviária Alto Rio São Francisco, Pirapora/MG – Nickolas Mendes (2018)


Corredeiras de Pirapora/MG, Alto São Francisco – Nickolas Mendes (2018)



Hoje a realidade é bem diversa, com o assoreamento de boa parte do leito do Rio, que deverá implicar a destinação de somas vultosas para restituir a navegabilidade na hidrovia, além de problemas ambientais. O volume de carga transportado é bem baixo, menos de 800 mil toneladas por ano, de carga geral e grãos. Atualmente, a navegação comercial do Rio São Francisco limita-se ao trecho entre Juazeiro/BA-Petrolina/PE e Ibotirama/BA, com extensão de apenas 576 km.
O transporte era anteriormente realizado pela Companhia de Navegação do São Francisco (Franave), utilizando comboio com empurrador e seis chatas, duas a duas, com 119 metros de comprimento e 16 metros de boca. Cada chata transporta 200 toneladas, perfazendo um total de 1.200 toneladas. A Serviço de Navegação Fluvial (Senaf) possui dois empurradores e oito chatas com capacidade de 500 toneladas cada.
Apesar de a Bacia do São Francisco ocupar uma área de cerca de 640 mil km2, o transporte hidroviário no Rio São Francisco, outrora importante, onde navegavam os gaiolas, como no Rio Mississipi, hoje não tem a mesma grandeza e glória. A hidrovia está subutilizada, pois além do assoreamento, não há integração com a ferrovia em Juazeiro e Pirapora.
O sistema São Francisco poderia ser parte de uma cadeia multimodal de produtos agrícolas destinados à exportação, iniciando-se com transporte rodoviário a partir das áreas produtoras ao longo do Vale do São Francisco, seguir por via fluvial rumo ao Sul até Pirapora, de onde o transporte por ferrovia, atingiria o Porto de Vitória, no Espírito Santo.
Em contrapartida, rumo ao Norte, o Polo Juazeiro-Petrolina poderia tornar-se um centro de captação de cargas, principalmente de grãos, que chegariam ao polo por hidrovia. A carga seguiria, então, por ferrovia, até o Porto de Aratu, na Bahia.
O projeto do Corredor Multimodal de Transporte do Rio São Francisco, em elaboração pelo Ministério da Infraestrutura, tem como objetivo ampliar, integrar e articular as estruturas hidroviárias, rodoviárias, ferroviárias e portuárias da Bacia Hidrográfica do São Francisco e resgatar o transporte fluvial de aproximadamente 1.300 km potencialmente navegáveis para fins comerciais.
O projeto conta com a parceria entre a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e o Corpo de Engenheiros do Exército dos Estados Unidos da América (Usace), e poderá resultar na elaboração da modelagem hidráulica e hidrológica do Projeto de Integração do São Francisco com as bacias do Nordeste Setentrional (PISF), maior obra de infraestrutura hídrica do Brasil em execução pelo Ministério do Desenvolvimento Regional e que tem a Codevasf como operadora federal.

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